Turismo em Minas Gerais | Um roteiro natural para sentir e ver Ouro Preto

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Foto por: Flávia Cardoso - Pça.Tiradentes, Ouro Preto
Atualizado em: 01/12/2021

Um roteiro natural para sentir e ver Ouro Preto

           

Uma cidade histórica com diferentes nuances e repleta de provocações sobre o passado. Mergulhe nesse roteiro e descubra mais sobre esse destino que guarda tanto da nossa história. 

 

Ouro Preto oferece  ao visitante interessado  um roteiro natural, que é o caminho histórico traçado pela própria formação de sua malha urbana, desde os anos iniciais do  século 18.

 

Em linha contínua,  ele  começa no Bairro do Padre Faria, atravessa toda a cidade, passando por seus principais atrativos turísticos, e termina no Bairro das Cabeças. Pequenas variações, de alcance fácil, num e outro lado do percurso, permitem conhecer todo o conjunto urbano.

 

Todo o trajeto pode ser feito em menos de um dia. A presença de um guia de turismo competente é indispensável assim como um veículo de até médio porte. O roteiro se aplica tão bem que poderia transformar-se em uma oferta para agências receptivas e guias, com claro sucesso se bem vendido. Fica a sugestão.

 

Um pouco sobre o que você verá em Ouro Preto

 

Ouro Preto,  barroca também na  topografia, implantada em topografia acidentada,  é cidade para se  contemplar, viver e sentir, com o seu casario colonial conurbado, vãos, portas e janelas múltiplas,  ruas estreitas e intimistas, becos e ladeiras, a cada instante uma surpresa. 

 

Mas, desde já, uma advertência: este mergulho na velha cidade colonial, Patrimônio Cultural da Humanidade (Unesco/1980), exige olhos e consciência interessados. Não se verá apenas o belo, mas também o drama urbano brasileiro, a ocupação perigosa de encostas.

 

Permite admirar conjuntos arquitetônicos íntegros e de rara beleza patrimonial, herança da técnica construtiva colonial luso-brasileira. Tem  bons restaurantes, hotéis e lojas variados,   sempre no  clima intimista que o cenário setecentista acolhedor propicia, igrejas  magníficas, que permitem leituras históricas e artísticas com seus ornatos, de excepcional lavra de grandes artistas,  esculturas em madeira e pedras,  talhaspinturas de sofisticada arte e muito talento, em que se destaca o mestre Antônio Francisco Lisboa, que lá nasceu (1737/38),  viveu e morreu (1814). 

 

Ouro  Preto permite e exalta o   turismo vivencial, que referencia o original e o autêntico, em aula presencial de raro encantamento. Grandezas e misérias, vultos históricos, revoltas e sublevações, multirracial,  entrechoque cultural,  mas a experiência é completa e única.

 

Roteiro de 1 dia em Ouro Preto

 

 

 

A Capela do Padre Faria inicia o roteiro e permite compreender sobre os primeiros núcleos de ocupação. Permite visualizar a  Serra do Ouro Preto,  onde o bandeirante Antônio Dias aportou a 24 de junho de 1698 e avistou, do outro lado do grand canyon gerado pelo rio Tripuí,  o Pico do Itacolomi, signo dominador e orientador de toda a região.

 

Foto: Pico do Itacolomi, que pode ser avistado mesmo do centro  de Ouro Preto.

 

Permite  contemplar o Morro da Queimada, das betas e mundéus e até da ocupação desordenada de hoje, drama maior das cidades brasileiras, que não se deve esconder. E ainda do drama social, dos primeiros tempos  até hoje.

 

Nasce ali povoado que transita entre o ouro e a fé, em meio à miscigenação étnica, de brancos, negros e índios, caldo de cultura que explica a capela do Padre Faria (João  Faria Fialho, padre-bandeirante, que veio com Antônio Dias), de 1701, com rica talha dourada,  portuguesa joanina (estilo referente ao tempo de dom João V, de Portugal),  da primeira fase do barroco. Jóia da arquitetura e da arte colonial luso-brasileira, encanta o visitante.

 

Foto: Igreja de Nossa Senhora do Rosário.

 

Sobe-se, em linha reta, para a Igreja de N.S. do Rosário e Santa Efigênia do Alto da Cruz, visita imprescindível para se conhecer a Vila Rica setecentista. Devoção negra, ornada com motivos afro-brasileiros, reflete as lutas sociais e raciais dos primeiros tempos. Nela, inicia-se a história de Chico Rei, do "reinado" ou "reizado", festa e cortejo,  mistura de santos católicos com primitivos orixás,  manifestação real do sincretismo  religioso/cultural. Possui talhas e pinturas belíssimas. E ocupa posição dominante, em altiplano, permitindo ampla vista de  Ouro Preto. Merece aula de aprofundamento.

 

Foto: Entrada da Mina do Chico Rei ou Mina da Encardideira.

 

Seguimos o caminho para o Bairro de Antônio Dias, homenagem ao fundador de Vila Rica (antigo nome de Ouro Preto). Antes, desviando 30 metros, é possível visitar a Mina da Encardideira, que pertenceu a Chico Rei e de onde tirou sua alforria e os meios para reconstruir seu reinado africano, iniciando tradição famosa do sincretismo religioso brasileiro. Na Mina, d. Mariazinha, ouropretana hospitaleira, conta tudo sobre a dura retirada do ouro, lendas e fatos.

 

Foto: Igreja de Nossa Senhora da Conceição (1730).

 

Domina todo o conjunto urbano a igreja de N. S. da Conceição, uma das mais imponentes matrizes de Minas,  de 1730,  de frontal em estilo jesuítico e que mostra talhas e ornatos das primeiras fases do Barroco Português trazido para as minas. Merece atenção e contemplação. No primeiro altar,  à direita de quem entra, devotado à N. S. da Boa Morte, foi sepultado Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, falecido a 18 de novembro de 1814.

 

A subida  para a Praça Tiradentes permite contemplar casario antigo, conurbado, o mais conservado de Ouro Preto, com as feições do século 18, visão exemplar da cidade luso-brasileira, com vias irregulares sinuosas, medievais, grade alternado, plantada em aclives que lhe dão o caráter barroco já no próprio movimento dos telhados sucessivos e sobrepostos.

 

Foto: Perfeita harmonia entre a Igreja de São Francisco e o contorno das serras que compõem a paisagem de Ouro Preto.

 

Foto: Belíssimo interior da Igreja de São Francisco.

 

Subindo a ladeira da rua do Ouvidor, contempla-se à esquerda a Igreja de São Francisco, obra de Aleijadinho, no risco e no frontispício, imperdível. Já rococó, de formas redondas e leves, já sem a profusão de ornatos do barroco joanino, severo e canônico como recomendou o Concílio de Trento, de 1549, de onde surgiu a Contra-Reforma.

 

Na pintura de Ataíde no forro da nave a obra prima da pintura de perspectiva: N. S. da Conceição, padroeira da ordem franciscana, sobre ao céu com uma orquestra de anjos. Nos púlpitos do arco-cruzeiro, no altar-mor, no lavabo da sacristia, na luz que penetra naturalmente, tudo revela a obra prima de Aleijadinho.

 

Foto: Palácio dos Governadores, na Praça Tiradentes.

 

Alcança-se a Praça Tiradentes. Contempla-se, claramente, o poder colonial. De um lado, o Palácio dos Governadores, obra da engenharia militar portuguesa, construída como forte de quatro pontas, em 1747,  Escola de Minas a partir de 1897, quando a capital de Minas muda para Belo Horizonte.

 

Foto: Vista da Praça Tiradentes, com o Museu da Inconfidência em um de seus extremos.

 

De outro lado, a Câmara e Cadeia, prédio de 1784, Museu da Inconfidência, criado por Getúlio Vargas em 1938 e inauguração em 1944. Seu desenho lembra o Museu Capitolino, em Roma, sede do antigo Senado Romano.  Há que se sentir a Praça e seu casario, expressões legítimas da cultura urbanística colonial portuguesa.

 

E, ao seu centro,  o monumento a Tiradentes, de 1892, edificado pela Assembléia  Legislativa, num dos seus primeiros atos já na República,  homenagem ao alferez da conjuração mineira de 1789, que o povo consagrou como seu mártir. Ali, todo ano, a 21 de abril, dia do seu enforcamento, no Rio, o Governo de Minas referencia a Joaquim José da Silva Xavier e também os outros inconfidentes que sonharam com Minas e o Brasil independentes. 

 

Os Museus de Mineralogia (uma das três maiores coleções mundiais de amostras mineralógicas) e da Ciência e da Técnica, da Escola de Minas, e o Museu da Inconfidência não podem deixar de ser visitados, não só pela riqueza de suas coleções mas porque dizem respeito  às raízes setecentistas da sociedade mineira. Ainda na Praça, o Centro Cultural da Fiemg sempre exibe alguma mostra documental ou de artes plásticas e oferece um bom café. E nele funciona o Posto dos Guias de Turismo, com profissionais licenciados pelo Ministério do Turismo, fundamentais para uma visita mais esclarecedora.

 

Antes de descermos a Rua Direita, nome popular dado à rua Conde de Bobadela, devemos visitar a Igreja do Carmo, o Teatro Municipal Casa da Ópera e o Museu do Oratório, situados a menos de um quarteirão da Praça Tiradentes.A igreja carmelita, com frontispício trabalhado pelo Aleijadinho, já rococó, leve e elegante, desponta no altiplano e permite a contemplação, no seu adro, de grande parte de Ouro Preto.

 

Na sua antiga Casa do Noviciado, está o Museu do Oratório, coleção de Ângela Gutierrez, com todos os tipos de oratórios encontrados em Minas, confeccionados pelas devoluções religiosas populares. E a Casa da Ópera-Teatro Municipal, a mais antiga das Américas em funcionamento,  construção de 1770, obra de um mecenas, Souza Lisboa, empresário teatral já naquela época.  É uma jóia arquitetônica, de boa qualidade cênica e acústica, rara e exemplar, imperdível.

 

Foto: Casarios do período colonial de Ouro Preto, na Rua Direita.

 

Poucas cidades antigas brasileiras guardam um conjunto de edificações setecentistas tão expressivo como o que encontramos na rua Direita. A multiplicidade de fachadas, as construções imponentes,  revelam  nos exemplares mais conservados,  não só a técnica construtiva colonial, mas a grandiosidade destas antigas residências, algumas com mais de 30 cômodos.

 

Neste trajeto, convive-se com lojas, restaurantes, cafés, bares, hotéis,  “repúblicas” de estudantes, alguns escritórios, ainda algumas residências,  mostrando a pujança da vida  cultural  e comercial de uma cidade histórica, destino turístico internacional.

 

Foto: Fachada da Casa dos Contos, construída em 1784.

 

O Largo dos Contos é o prosseguimento natural deste roteiro. O chafariz tricentenário relembra a velha cidade e sua missão de prover de água aos moradores . A Casa dos Contos, um dos mais significativos exemplares de edificações coloniais, construído em 1784, por José Rodrigues de Macedo, o mais rico morador de então, contratador das entradas e dízimos, inconfidente disfarçado, escapou da Devassa mas, dez anos depois, perdeu a residência para o governo colonial. E, até hoje, pertence ao Ministério da Fazenda, abrigando uma mostra permanente da evolução de moedas. Em 1789, no cubículo embaixo da sua grande escada, foi encontrado morto o inconfidente e poeta Cláudio Manoel da Costa.

 

Ultrapassada a Ponte dos Contos (neste vale, a Prefeitura  resgata o antigo Horto Botânico, com áreas de lazer, obra ousada mas de grande impacto na adequação turística de Ouro Preto), alcança-se a rua São José. Tortuosa, fora do prumo, com dois pavimentos, janelas variadas em fachadas preservadas, ao mesmo tempo comercial/bancária, turística e residencial.

 

Foto: Matriz de Nossa Senhora do Pilar (1733).

 

Pode-se subir a rua íngreme até a Igreja de São José. Mas, ao final da rua, o Largo da Alegria, apresenta ao visitante duas opções: à esquerda, descer a rua da Escadinha e visitar a Matriz do Pilar, imperdível, inaugurada em 1733, com ricas talhas douradas em altares que exibem todas as fases do barroco. No subterrâneo, museu de arte sacra, com ricas e raras peças da indumentária, da liturgia das missas e procissões. A Matriz do Pilar merece aprofundamento, para os mais interessados.

 

Foto: Igreja de Nossa Senhora do Rosário .

 

Do Pilar é possível alcançar o Largo do Rosário, onde a Igreja de N.S. do Rosário, de devoção negra, na sua forma elíptica, integra um conjunto harmonioso. Bairro antigo, de muitas tradições e festas. Do Rosário para o Pilar, em 1733, saiu o famoso cortejo denominado “Triunfo Eucarístico”, de inauguração da Matriz do Pilar, espetáculo profano-religioso, antecipador do barroquismo como estilo de arte e de vida da velha Vila Rica.

 

Do Largo do Rosário deve-se prosseguir na rua Alvarenga até a Capela de São Miguel e Almas ou de Bom Jesus do Matosinhos, onde  Aleijadinho criou duas obras: o arcanjo que habita o nicho e a escultura Almas no Purgatório, ambas no frontispício. Ao lado o Colégio Arquidiocesano. 

 

Mais adiante, casa do poeta Bernardo Guimarães, hoje sede da Fundação de Arte de Preto, um dos maiores casarões de Ouro Preto. Restaurado, merece visita. O velho bairro das Cabeças, essencialmente domiciliar,  outrora caminho de entrada de Ouro Preto, termina nosso roteiro. 

Dicas para não esquecer

  • Contrate um guia de turismo. Guias são fundamentais para uma visita enriquecedora. Mas fique atento, confie seu passeio aos guias que apresentem sua credencial no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos  (CADASTUR).
  • Utilize um veículo até de porte médio (carro, van ou microônibus) para conseguir circular tranquilamente pelas ruas da cidade.
  • Vá com um calçado confortável e com o solado que não deslize para evitar incidentes caminhando pelas ruas de calçamento.

 

Agora sim, você já pode dizer que o passeio do próximo fim de semana está garantido.

 

Agora conta pra gente, se você já conhece Ouro Preto, compartilhe nos comentários uma lembrança que tem da cidade. E, se ainda não conhece, já organiza essa viagem pra compartilhar sua lembrança com a gente!

 

Buscando mais sobre as cidades históricas mineiras? Leia: Cidades históricas mineiras: um mergulho na nossa história.

Sobre o Autor

Mauro Werkema

Jornalista, estudioso da História de Minas, autor de livros e artigos sobre Minas Gerais, como “História, arte e sonho na formação de Minas Gerais”.

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