Turismo em Minas Gerais | Entre Mulheres: Travessia da Lapinha

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Foto por: Jéssica Marques
Atualizado em: 20/09/2022

Travessia Lapinha - Tabuleiro, só entre mulheres

 

Brindamos esse dia especial com um relato de um trekking renovador na belíssima região da Serra do Cipó. Se você tem preparo para encarar esse desafio ou está sonhando em viver essa experiência da travessia Lapinha - Tabuleiro, esse grupo de mulheres vem dizer que é possível. 

 

Quando se pensa em travessias no Brasil, a Lapinha - Tabuleiro está entre as mais clássicas.

A trilha liga o vilarejo de Lapinha da Serra, no município de Santana do Riacho, ao distrito de Tabuleiro, na cidade de Conceição do Mato Dentro. São cerca de 34 km percorridos em dois dias, cruzando cenários deslumbrantes da Serra do Espinhaço.

Vales, picos, rochas, rios, cachoeiras, campos de altitude, vegetação de Cerrado e de Mata Atlântica vão se alternando e surpreendendo os caminhantes.

E para fechar a travessia, a Cachoeira do Tabuleiro, a maior de Minas, com queda de 273 metros, se descortina no centro de uma montanha em formato de coração.

 

Travessia Lapinha - Tabuleiro

Foto: Paisagem da Travessia.

 

Só essa descrição já é o suficiente para deixar meus pezinhos inquietos querendo trilhar, mas a minha travessia ainda teve um estímulo a mais, e muito especial: percorrê-la em um grupo formado apenas por mulheres, incluindo as condutoras.

E assim, entre os dias 23 e 24 de outubro de 2021, com outras 15 mulheres, percorri esse caminho lindo, tanto pela paisagem quanto pelas trocas com o grupo.

 

Serra do Espinhaço

Foto: Serra no início da travessia.

 

Travessia Lapinha - Tabuleiro

Foto: Início da travessia.

 

Essa aventura feminina foi organizada por um grupo que eu já acompanhava pelas redes sociais há um tempo, o Mulheres na Trilha. O objetivo do grupo é apoiar as mulheres que têm vontade de fazer trekking, compartilhando dicas e informações, e permitindo encontros que levam à realização de atividades juntas, como o que deu origem à nossa travessia na Lapinha.

 

Grupo de Mulheres na Trilha

Foto: Grupo Mulheres na Trilha.

 

A Travessia

 

Dia 1

Saímos de Belo Horizonte, ainda de madrugada. Até a Lapinha, são cerca de 135 km. Chegamos lá ao amanhecer. Todo o vilarejo ainda estava dormindo: ninguém na rua, todos os estabelecimentos e casas fechados.

Encontramos um lugar na pracinha para nos acomodarmos enquanto fazíamos um lanche e nos preparávamos para subir. O céu estava um pouco nublado e fazia até um pouco de frio, mas depois de vários dias de chuva, contávamos com a previsão de tempo firme no final de semana. E assim a natureza nos presenteou.

 

Lapinha da Serra

Foto: Distrito de Lapinha da Serra.

 

O início já testou nosso preparo físico. É uma subida longa, cerca de 4 km, e o terreno é rochoso com pedras soltas, o que aumenta a dificuldade. Mas fomos cada uma no seu ritmo, sem forçar.

A primeira parada para descanso foi abençoada por uma pequena capela construída de pedras, no alto da serra.

Superada a subida, o percurso seguinte foi menos irregular, com vegetação rasteira e alguns pontos de solo enxarcado por causa das chuvas dos dias anteriores. Mas sempre tinha alguém para dar a mão, sugerir o melhor ponto para pisar ou gargalhar junto se o pé atolasse na lama.

 

Travessia Lapinha - Travessão

Foto: Subida no início da travessia.

 

Travessia Lapinha - Travessão

Foto: Capela de pedras na travessia Lapinha - Travessão.

 

Cerca de 9 km após começarmos a caminhar, chegamos na Prainha, uma margem de rio coberta de pedras brancas, onde paramos para descansar e “almoçar”.

Compartilhando o que cada uma trouxe, deu para perceber que a variedade de lanches para trilha é grande. Desde os mais caseiros aos sem necessidade de preparo, ou até processados, com criatividade é possível levar comidas gostosas, variadas e que não vão estragar no caminho.

 

Prainha Travessia Lapinha - Tabuleiro

Foto: Prainha a margem de um rio.

 

A partir da Prainha, o caminho volta a ter subidas, mas, dessa vez, intercaladas com trechos de descidas, e assim segue até o final do dia.

O terreno e a vegetação também vão se alterando: trilha com solo firme, caminhos mais largos, trechos com rochas e pedras soltas, percursos mais sombreados ou totalmente expostos ao sol.

Acho que a única coisa que se mantinha constante era a disposição do grupo.

 

Travessia Lapinha - Tabuleiro

Foto: Trecho da estrada.

 

Travessia Lapinha - Tabuleiro

Foto: Trecho da trilha.

 

Quando já estávamos perto de 11 km de caminhada, vi a primeira placa indicando Tabuleiro. Foi como sentir que era realidade que eu estava fazendo a tão sonhada travessia, e me deu uma nova carga de energia.

Pouco mais a frente, cerca de 1,5 km depois, já entramos em área de proteção ambiental. Inicialmente passamos por uma área administrada pelo Instituto Estadual de Florestas e, depois, por uma área protegida pelo município de Conceição do Mato Dentro, o Parque Natural Municipal do Tabuleiro.

 

Lapinha x Tabuleiro

Foto: Placa Lapinha x Tabuleiro.

 

Como são poucas placas no caminho, os marcos da trilha costumam ser porteiras e as casas de alguns moradores, representando bem a paisagem mineira rural.

E é em uma casa assim, com uma acolhida bem mineira, que chegamos para passar a noite após 18 km de caminhada. Foi um momento de confraternização, relaxamento, conversa e cerveja, a típica “resenha da trilha”.

No alojamento jantamos comida mineira caseira bem gostosa, e, na manhã seguinte, tivemos um café reforçado para continuar a travessia.

 

Foto: Porteira na travessia.

 

Foto: Casa de apoio.

 

Dia 2

No segundo dia, o deslocamento é um pouco menor: 16 km, sendo 10 km até a parte alta da Cachoeira do Tabuleiro, e mais 6 km até a Portaria do Parque do Tabuleiro, onde terminaríamos a trilha.

Saímos cedo, novamente com o tempo nublado, o que para a trilha é bom pois reduz o desconforto e desgaste causado pelo calor. Observávamos as nuvens de chuva nas áreas ao nosso redor, mas, felizmente, sem nos alcançar.

 

Travessia Lapinha - Tabuleiro

Foto: Subida na montanha, com chuva ao fundo.

 

Seguimos por cerca de 3 km sem grande mudança de altitude, até iniciarmos a descida para a parte alta da Cachoeira do Tabuleiro. Parece estranho dizer que descemos para chegar na parte alta, mas é esse o percurso.

Descemos por cerca de 3 km por um trecho bastante íngreme e com pedras soltas, que demanda mais cuidado, até alcançar o rio. A partir daí, começam as quedas e a trilha segue pelas rochas margeando e cruzando o leito.

Em alguns pontos há necessidade de apoiar-se com as mãos para subir degraus maiores. Pode-se seguir o rio até o alto da cachoeira, mas eu preferi ficar, com uma parte do grupo, curtindo as primeiras cascatas e poços d’água, pois tenho vertigem de altura e porque adoro tomar banho de rio.

Para quem for até a ponta, recomendo muito cuidado e atenção, além de seguir as orientações do parque e dos guardas-parques.

 

Foto: Travessia pelo leito do rio.

 

Foto: Quedas e poços d’água.

 

Depois de um tempo aproveitando a água, iniciamos o retorno por parte do trecho onde havíamos passado mais cedo, até pegar a trilha em direção à portaria. Se antes descemos bastante, agora era hora de subir muito e o respeito ao limite físico de cada uma era fundamental.

 

Foto: Trecho da subida.

 

A trilha em direção à Portaria foram os 5 km finais da travessia. Sem grande dificuldade técnica, mas que demanda atenção por causa das pedras soltas e totalmente em descida, ela também oferece visuais maravilhosos da região.  

O principal destaque é o Mirante do Tabuleiro, de onde tem-se a noção da dimensão da cachoeira. Lá também é de onde se observa o formato de meio coração da montanha em volta da queda.

 

Cachoeira do Tabuleiro

Foto: Cachoeira do Tabuleiro, maior cachoeira do estado.

 

Cachoeira do Tabuleiro

Foto: Selfie completando o coração feito pela montanha.

 

Chegamos na Portaria próximo ao horário de fechamento do parque, mas com tempo ainda para usar a infraestrutura de banheiros e bebedouros. Do parque, fomos para o Distrito de Tabuleiro para um “almojanta” (mistura de almoço com jantar, por ser no final da tarde, mas antes do anoitecer, bem comum em dias de trilha).

Fomos recebidas com aquela receptividade com sorriso largo no rosto e um tempero maravilhoso. Momento em que a adrenalina baixou, pois a travessia estava concluída, em que os sentimentos de felicidade, gratidão, realização se misturavam a uma admiração por essas 16 mulheres.

 

Mas vão só mulheres?

 

Foi uma forte conexão entre as participantes da travessia, que criou um ambiente de parceria, confiança, acolhimento, partilha, amizade. Um encontro de mulheres inteligentes, fortes, corajosas, simpáticas, espertas, divertidas.

 

Mulheres na trilha

Foto: Grupo Mulheres na Trilha.

 

Algumas, como eu, foram sem conhecer pessoalmente ninguém no grupo, e ainda assim, todas estavam integradas. A paixão pelo trekking uniu diferentes histórias, profissões, aparências, gostos, idades, criando um espaço de identificação quanto a interesses, experiências, dúvidas e sonhos.

Ao contar dessa experiência para pessoas próximas, vi e ouvi algumas desconfianças quanto à segurança de fazer uma travessia em ambiente natural apenas com mulheres.

O que eu respondi é que analisei antes os seguintes aspectos: estava indo com quem conhecia a trilha, pessoas com bastante experiência em ambiente natural, a atividade estava bem organizada e seguindo as orientações do parque.

O fato de ser homem ou mulher conduzindo ou integrando o grupo nunca foi uma questão. Mas depois dessa experiência só com mulheres, passei a acreditar que é um delicioso formato, e que pode ser uma das opções para meus próximos trekkings.

Que mais mulheres se aventurem por trilhas, sejam seus caminhos na natureza, na cidade, nas estradas, dentro de casa, no trabalho, na família, ou onde escolherem trilhar. Que mais pessoas se apoiem na realização de seus sonhos. E que mais mulheres venham para o trekking.

Juliana Couto Azevedo, de Bom Despacho, também compartilha um pouco sobre a sua experiência fazendo trilha pela primeira vez com um grupo de mulheres:

 

A travessia Lapinha x Tabuleiro foi uma experiência incrível. Minha motivação principal foram as belezas de Minas. Sou apaixonada com atividades ao ar livre e tinha muita vontade de fazer essa travessia, pois já havia visto fotos e ouvido falar muito sobre o local.
 


 

Comecei a fazer caminhadas e pequenas trilhas na minha cidade, visando ganhar preparo para conhecer a Lapinha, então, quando a viagem com as meninas surgiu, não pensei duas vezes.

A oportunidade de estar em meio à natureza, longe da correria do dia a dia, ouvindo o som da mata é algo revigorante para mim.
 



A experiência de fazer uma travessia só com mulheres também foi muito especial. Muita troca de vivências, possibilidade de aprimorar os conhecimentos sobre as trilhas com mulheres mais experientes nesse quesito e troca de informações “de mulher pra mulher”, afinal, muitas vezes só nós nos entendemos.

 

 Juliana Couto Azevedo - @julianacoutoazevedo

 

 

 

Dicas sobre a trilha

 

  • Como há muito desnível e trechos com pedras soltas, o uso de bastão de caminhada é muito recomendado para ajudar no equilíbrio e a não forçar o joelho. Algumas pessoas andam com dois bastões, outras fazem com apenas um.
  • É uma trilha considerada de nível médio, por isso, observe seu condicionamento físico e prepare-se fazendo outros percursos antes.
  • Use calçado próprio para trilhas, que já tenha sido usado antes para evitar machucar. Também devem ser usadas roupas adequadas à atividade e ao clima, ou seja, que permitam a mobilidade, protejam de sol, frio e chuva. Eu recomendo calça e blusa de manga comprida com proteção UV, além de boné ou viseira.
  • As alças da mochila devem estar bem ajustadas para evitar desequilíbrio ou dores. Leve apenas o necessário para não carregar peso à toa. Como há alojamento e refeições, não é preciso levar muita coisa. Protetor solar, água, lanches de trilha e toalha são importantes, bem como biquini se quiser entrar na água.

  • Os pontos de apoio oferecem luz e água quente, área para camping e dormitório. Precisam ser reservados com antecedência.
  • É preciso autorização do Parque Natural Municipal do Tabuleiro para fazer a travessia.
  • Contrate um guia ou agência que faça esse percurso, eles farão a reserva do ponto de apoio/ alojamento e solicitarão a autorização do Parque Natural Municipal do Tabuleiro. Respeite as orientações dos alojamentos e das áreas visitadas.
  • Algumas operadoras telefônicas funcionam na área da travessia.
  • Não é permitido animais domésticos.
  • Melhor época para visitar: outono e inverno, porque há menos chuva. Nós acabamos indo na primavera e tivemos que lidar com a conferência constante da previsão do tempo antes de confirmar a travessia.
  • O perfil do Parque Natural Municipal do Tabuleiro, no Instagram, traz outras informações e orientações sobre a travessia, o parque e a região: @parquenaturaltabuleiro

 

Mulheres na trilha

Foto: Mulheres da Travessia.

 

Gostou desse relato recheado de dicas? Então já reúne todas suas amigas para aproveitar essa travessia!

 

Não perca tempo e conheça o Trekking na Serra do Cipó: Travessão.

Sobre o Autor

Gisele Mafra

Turismóloga amante de viagens, trilhas, natureza e autodesenvolvimento. Gerente de Uso Público e Eventos da Fundação de Parques e Zoobotânica de Belo Horizonte.

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